Quando era criança, minha mãe costumava cantar uma música folclórica antiga, que ela também aprendeu quando criança e ainda não consegui localizar sua origem. "Negro não sabe o que é dor Negro não tem alma não" Assim dizia o feitor Com o chicote na mão Malvado banzo me mata Quero à pátria voltar Na minha terra sou livre Como avezinha no ar Criança curiosa, perguntei o que era "banzo" e minha mãe explicou: "Banzo é uma tristeza que os escravos sentiam quando vinham para o Brasil. Muitos morriam por causa disso. É uma saudade muito intensa".
Ainda hoje existem poucos sites que explicam de forma clara o que era essa manifestação psicopatológica.
A origem da palavra “Banzo” é bastante discutida, mas parece que tem raízes africanas, e equivale a “pensar ou meditar”. Em relatos médicos antigos (descritos melhor abaixo), o termo também designa uma doença. A maioria das definições traz que banzo era um estado de melancolia e depressão profunda que se apossava do escravo africano logo após o desembarque no Brasil, seguido de parada da alimentação e da comunicação. Geralmente, os que caíam nessa situação de nostalgia profunda terminavam morrendo. Pensava-se que o banzo atingia somente a primeira geração de escravos (aqueles diretamente vindos da África) e, assim, as demais gerações não pereciam deste mal.
Outra teoria pressupõe que o banzo não tinha causas psicológicas: os africanos apresentavam os sintomas porque estavam contaminados, antes de embarcar, pela "doença do sono", enfermidade decorrente da picada da mosca tsé-tsé. Esta hipótese, no entanto, deixa a desejar já que muitos dos escravos acometidos do banzo suicidavam, o que não ocorreria no caso da doença do sono.
João Ribeiro (1900) assim descreve os africanos escravos acometidos da moléstia:
"Uma moléstia estranha, que é a saudade da pátria, uma espécie de loucura nostálgica, suicídio forçado, o banzo dizima-os pela inanição e fastio, ou os torna apáticos e idiotas". [Dicionário da Escravidão Negra no Brasil, Clóvis Moura]
Segundo Venâncio, “no século 19, com o desenvolvimento das primeiras teorias psicológicas, o comportamento dos escravos banzeiros foi reconhecido como distúrbio mental. Em 1844, Joaquim Manoel de Macedo, na tese médica intitulada Considerações Sobre a Nostalgia, afirma:: “[...] estamos convencidos de que a espantosa mortandade que entre nós se observa nos africanos, principalmente nos recém-chegados, bem como de que o número de suicídios que entre eles se conta, tem seu tanto de dívida a nostalgia [...]”
Hoje é reconhecido que a migração (mudança de localização geográfica que leva a desenraizamento social) aumenta o risco de doenças mentais. Migrações forçadas atreladas a sofrimento físico e mental, como as forçadas aos escravos africanos são receitas prontas para depressão grave. Qualquer crise de refugiados, seja por guerra, doenças ou migração econômica também acarreta aumento de doenças mentais.
Mesmo em nossa sociedade brasileira "pacífica", atenção especial deve ser dada a pessoas que mudaram de cidade, estado, etc., devido ao isolamento e às novas dificuldades de vida.
Mesmo que não conheçamos muitos refugiados de guerra ou imigrantes no Brasil, podemos dar atenção especial pode ser dada àquela vizinha que mudou recentemente de outra região, ao novo colaborador na empresa que veio de outro estado ou a um colega da escola que mudou de uma cidade menor. Um "bom dia" e pequenos atos de gentileza ajudam a diminuir o isolamento nessas situações.